O RELÓGIO NA TORRE DA IGREJA MARCAVA CINCO PARA AS SEIS, MAS A PEQUENA CIDADE DE SERRAVISTA JÁ ESTAVA ENVOLTA EM UM CREPÚSCULO DOURADO. BIA, COM SEUS DEZ ANOS E UM BONÉ DE EXPLORADORA PUÍDO, PEDALAVA SUA BICICLETA VELHA COM A DETERMINAÇÃO DE UM CAVALEIRO EM BUSCA DE UM DRAGÃO. AO SEU LADO, ZECA, SEU INSEPARÁVEL GOLDEN RETRIEVER, CORRIA FELIZ, COM A LÍNGUA PARA FORA E UM OLHAR DE PURA LEALDADE. O DESTINO DELES: A ANTIGA CASA DO SR. SABICHÃO, UM CIENTISTA RECLUSO QUE HAVIA DESAPARECIDO MISTERIOSAMENTE HÁ UM ANO.

"HOJE É O DIA, ZECA!", BIA SUSSURROU, ENQUANTO DESVIAVA DE UMA POÇA. "SINTO QUE VAMOS DESCOBRIR O QUE ACONTECEU."

A CASA, COM SUA FACHADA DE MADEIRA ESCURA E JANELAS EMPOEIRADAS, PARECIA SORRIR COM UM SORRISO BANGUELA. NO JARDIM, A GRAMA ALTA E AS ÁRVORES RETORCIDAS CRIAVAM SOMBRAS DANÇANTES, TRANSFORMANDO CADA ARBUSTO EM UMA CRIATURA FANTASMAGÓRICA. BIA EMPURROU O PORTÃO RANGENTE E DESCEU DA BICICLETA, COM O CORAÇÃO BATENDO MAIS FORTE DO QUE A ASA DE UM BEIJA-FLOR.

A PORTA DA FRENTE ESTAVA ENTREABERTA. UM ARREPIO PERCORREU A ESPINHA DE BIA. ELA SABIA QUE NÃO DEVERIA ENTRAR, MAS A CURIOSIDADE, COMO UM ÍMÃ INVISÍVEL, A PUXAVA PARA DENTRO. ZECA, COM UM LATIDO BAIXO, CUTUCOU SUA MÃO.

"VAMOS, GAROTO. SE O SR. SABICHÃO NÃO VOLTOU, ALGUÉM PRECISA ARRUMAR A BAGUNÇA."

O INTERIOR DA CASA ERA UM LABIRINTO DE MÓVEIS COBERTOS POR LENÇÓIS BRANCOS, COMO FANTASMAS SILENCIOSOS. O CHEIRO DE MOFO E LIVROS ANTIGOS PAIRAVA NO AR. BIA ACENDEU SUA LANTERNA, E O FEIXE DE LUZ DANÇOU PELAS PAREDES, REVELANDO TEIAS DE ARANHA E RETRATOS EMPOEIRADOS.

ELES EXPLORARAM A SALA DE ESTAR, A COZINHA (COM PANELAS SUJAS E RESTOS DE ALGO QUE PARECIA TER SIDO PIPOCA) E FINALMENTE, O QUE PARECIA SER O ESCRITÓRIO DO CIENTISTA. LIVROS EMPILHADOS DO CHÃO AO TETO, MAPAS ANTIGOS ESPALHADOS SOBRE UMA MESA, E UM QUADRO NEGRO REPLETO DE FÓRMULAS INCOMPREENSÍVEIS.

ENQUANTO BIA EXAMINAVA OS MAPAS, ZECA FAREJOU UM ARMÁRIO DE MADEIRA MACIÇA, ENCOSTADO NA PAREDE. ELE ARRANHOU A PORTA E LATIU BAIXINHO.

"O QUE FOI, AMIGÃO? ACHOU UM RATO?" BIA SE APROXIMOU, E QUANDO ABRIU A PORTA, UM GRITO ABAFADO ESCAPOU DE SUA GARGANTA.

LÁ DENTRO, APOIADO EM UM CANTO, ESTAVA UM ESQUELETO! NÃO UM ESQUELETO DE VERDADE, MAS UM MODELO DE ESTUDO, COMO OS QUE SE VEEM EM CONSULTÓRIOS MÉDICOS. BIA SOLTOU UM SUSPIRO DE ALÍVIO, MAS A SURPRESA NÃO DUROU MUITO. PRESO AO CRÂNIO DO ESQUELETO, HAVIA UM PAPEL AMARELADO.

COM AS MÃOS TRÊMULAS, BIA PEGOU O BILHETE. A LETRA, FINA E ELEGANTE, DIZIA:

"PARA O VALENTE QUE DESVENDAR O MISTÉRIO DO MEU SUMIÇO, A CHAVE PARA UM TESOURO ANTIGO SERÁ SUA. PROCURE NO LUGAR ONDE O TEMPO SE ESCONDE E A LUZ SE CURVA.

BIA RELEU O BILHETE VÁRIAS VEZES. "UM TESOURO? MAS ONDE O TEMPO SE ESCONDE E A LUZ SE CURVA?"

ZECA, COM SUA INTELIGÊNCIA CANINA, COMEÇOU A FAREJAR INTENSAMENTE UM PONTO NA PAREDE ATRÁS DO ARMÁRIO. BIA, INTRIGADA, NOTOU UMA PEQUENA FRESTA NA MADEIRA. ELA FORÇOU, E UM COMPARTIMENTO SECRETO SE ABRIU, REVELANDO UM BAÚ DE MADEIRA ESCURECIDA.

DENTRO DO BAÚ, HAVIA UM LIVRO DE CAPA DE COURO COM UM SÍMBOLO ESTRANHO, UM RELÓGIO DE BOLSO ANTIGO, UMA BÚSSOLA E UM MAPA RASGADO. O MAPA NÃO PARECIA SER DAQUELA CIDADE.

"ZECA, É UM MAPA DE OUTRO LUGAR!", BIA EXCLAMOU.

ELES PASSARAM HORAS DESVENDANDO AS PISTAS. O RELÓGIO, QUANDO VIRADO DE CABEÇA PARA BAIXO, REVELAVA UMA PEQUENA INSCRIÇÃO NA PARTE DE TRÁS: "AONDE AS HORAS NÃO VOLTAM". A BÚSSOLA, QUANDO POSICIONADA SOBRE O MAPA, APONTAVA PARA UM PONTO ESPECÍFICO, UMA ILHA DISTANTE NO MEIO DE UM LAGO.

A AVENTURA HAVIA APENAS COMEÇADO. BIA E ZECA, COM O MAPA EM MÃOS E A PROMESSA DE UM TESOURO, SABIAM QUE O MISTÉRIO DO SR. SABICHÃO ESTAVA LONGE DE SER DESVENDADO. MAS UMA COISA ERA CERTA: AQUELE ESQUELETO NO ARMÁRIO NÃO ERA ASSUSTADOR, MAS SIM O GUARDIÃO DE UM SEGREDO, E ELES ESTAVAM PRONTOS PARA A JORNADA.

A MANHÃ SEGUINTE NASCEU COM O CANTO DOS PÁSSAROS E O SOL FILTRANDO PELAS CORTINAS DO QUARTO DE BIA. ELA MAL HAVIA PREGADO O OLHO, ANSIOSA PELA AVENTURA QUE A AGUARDAVA. ZECA, FAREJANDO A ANIMAÇÃO DA MENINA, ABANAVA O RABO INCESSANTEMENTE.

COM O MAPA CUIDADOSAMENTE DOBRADO NO BOLSO E O LIVRO MISTERIOSO NA MOCHILA, BIA E ZECA SEGUIRAM PARA O LAGO QUE FICAVA NOS ARREDORES DE SERRAVISTA. ALUGARAM UM PEQUENO BARCO A REMOS DE UM VELHO PESCADOR RABUGENTO, QUE OS OLHOU COM CURIOSIDADE ENQUANTO ELES PARTIAM EM DIREÇÃO À ILHA.

A ILHA, VISTA DE LONGE, PARECIA UM GIGANTE ADORMECIDO COBERTO DE ÁRVORES. À MEDIDA QUE SE APROXIMAVAM, BIA PODIA DISTINGUIR ROCHAS ESCARPADAS E A VEGETAÇÃO DENSA QUE PARECIA ENGOLIR QUALQUER VESTÍGIO DE CIVILIZAÇÃO. ERA UM LUGAR SELVAGEM E ISOLADO, PERFEITO PARA ESCONDER UM TESOURO ANTIGO.

AO DESEMBARCAREM EM UMA PEQUENA PRAIA DE SEIXOS, O SILÊNCIO DA ILHA OS ENVOLVEU. APENAS O SOM DAS ONDAS QUEBRANDO NA COSTA E O MURMÚRIO DO VENTO NAS FOLHAS QUEBRAVAM A QUIETUDE. BIA CONSULTOU O MAPA. AS INDICAÇÕES ERAM VAGAS, MAS UM DESENHO DE UMA ÁRVORE RETORCIDA COM UMA MARCA EM FORMA DE LUA CRESCENTE PARECIA SER O PONTO DE PARTIDA.

ELES CAMINHARAM PELA ILHA, DESVIANDO DE CIPÓS E SUBINDO PEQUENAS COLINAS. ZECA, COM SEU FARO APURADO, GUIAVA BIA POR ENTRE A MATA FECHADA. DEPOIS DE UMA HORA DE BUSCA, AVISTARAM A ÁRVORE. ERA MAIS VELHA E IMPONENTE DO QUE QUALQUER OUTRA NA ILHA, COM GALHOS QUE SE RETORCIAM COMO BRAÇOS ESQUELÉTICOS EM DIREÇÃO AO CÉU. NA BASE DO TRONCO, A MARCA DA LUA CRESCENTE ESTAVA GRAVADA NA MADEIRA MUSGOSA.

"AQUI ESTÁ!", BIA EXCLAMOU, UM MISTO DE EXCITAÇÃO E APREENSÃO EM SUA VOZ.

PRÓXIMO À ÁRVORE, HAVIA UMA FENDA ESTREITA ENTRE DUAS GRANDES ROCHAS. BIA TENTOU PASSAR, MAS ERA MUITO APERTADO. ZECA, ENTÃO, COMEÇOU A LATIR PARA UM PONTO ESPECÍFICO NO CHÃO, PERTO DA ENTRADA DA FENDA. BIA SE ABAIXOU E EXAMINOU O LOCAL. HAVIA UMA PEQUENA PLACA DE PEDRA, QUASE ESCONDIDA SOB AS FOLHAS SECAS. ELA TENTOU MOVÊ-LA, MAS ESTAVA FIRMEMENTE ENCAIXADA.

FOI ENTÃO QUE BIA SE LEMBROU DO LIVRO DE CAPA DE COURO. ELA O ABRIU E FOLHEOU AS PÁGINAS AMARELADAS. EM UMA DAS PÁGINAS, HAVIA UM DESENHO DE UMA PLACA DE PEDRA IDÊNTICA À QUE ENCONTRARAM, E AO LADO, UM PEQUENO ENIGMA:

O PESO DA ÁGUA REVELA O CAMINHO SECRETO.

BIA OLHOU PARA O LAGO, QUE BRILHAVA SOB O SOL DA TARDE. UMA IDEIA SURGIU EM SUA MENTE. ELA CORREU ATÉ A MARGEM, ENCHEU SUA GARRAFA DE ÁGUA E VOLTOU PARA A PLACA DE PEDRA. COM CUIDADO, DESPEJOU A ÁGUA SOBRE A SUPERFÍCIE DA PEDRA.

PARA SUA SURPRESA, A ÁGUA ESCORREU PARA AS BORDAS DA PLACA, REVELANDO RANHURAS FINAS QUE FORMAVAM UM DESENHO: UMA SETA APONTANDO PARA A FENDA ENTRE AS ROCHAS. E MAIS INCRÍVEL, AO MOLHAR A PEDRA, ELA PARECEU CEDER LEVEMENTE. BIA TENTOU NOVAMENTE EMPURRAR A PLACA, E DESTA VEZ, COM UM CLIQUE SUAVE, ELA DESLIZOU PARA O LADO, REVELANDO UMA PASSAGEM ESCURA QUE SE APROFUNDAVA SOB AS ROCHAS.

BIA ACENDEU SUA LANTERNA. A PASSAGEM ERA ESTREITA E ÚMIDA, COM UM CHEIRO DE TERRA MOLHADA E ALGO MAIS... ALGO ANTIGO E MISTERIOSO. ZECA HESITOU POR UM MOMENTO, MAS AO VER A DETERMINAÇÃO NOS OLHOS DE BIA, SEGUIU-A CORAJOSAMENTE PARA DENTRO DA ESCURIDÃO.

A PASSAGEM SECRETA SE ABRIA EM UMA CAVERNA ESPAÇOSA, ILUMINADA POR UMA LUZ TÊNUE QUE VINHA DE UMA ABERTURA NO TETO, REVELANDO UMA PEQUENA PISCINA NATURAL DE ÁGUA CRISTALINA. O AR ALI ERA ESTRANHAMENTE FRESCO E PARECIA VIBRAR COM UMA ENERGIA ANTIGA. ESTALACTITES E ESTALAGMITES FORMAVAM ESCULTURAS NATURAIS IMPRESSIONANTES, E O SOM SUAVE DO GOTEJAR DA ÁGUA ECOAVA PELO AMBIENTE.

NO CENTRO DA CAVERNA, HAVIA UMA ESTRUTURA DE PEDRA ANTIGA, QUE PARECIA UM ALTAR. SOBRE ELA, REPOUSAVA UM OBJETO COBERTO POR UM PANO ESCURO. O CORAÇÃO DE BIA BATIA FORTE, E ZECA ROSNOU BAIXINHO, COM OS PELOS ERIÇADOS, MAS SEM MOSTRAR MEDO.

COM AS MÃOS TRÊMULAS, BIA REMOVEU O PANO. ALI, BRILHANDO À LUZ DIFUSA, NÃO HAVIA OURO NEM JOIAS, MAS SIM UM TELESCÓPIO ANTIGO, FEITO DE BRONZE E COBERTO POR ESTRANHAS INSCRIÇÕES. AO LADO, UM PEQUENO CADERNO DE CAPA DE COURO, MUITO PARECIDO COM O QUE BIA TINHA, E UMA CARTA LACRADA.

"UM TELESCÓPIO?", BIA SUSSURROU, CONFUSA. "MAS ONDE ESTÁ O TESOURO?"

ELA ABRIU A CARTA. A LETRA ERA A MESMA DO SR. SABICHÃO, E O BILHETE DIZIA:

MINHA JOVEM E CURIOSA AVENTUREIRA,

SE VOCÊ CHEGOU ATÉ AQUI, DESVENDOU MEUS ENIGMAS E PROVOU SUA CORAGEM. O MAIOR TESOURO QUE UM CIENTISTA PODE DEIXAR NÃO É OURO, MAS SIM O CONHECIMENTO E A CURIOSIDADE. ESTE TELESCÓPIO É A CHAVE PARA OS SEGREDOS DO UNIVERSO. ATRAVÉS DELE, VOCÊ PODERÁ OBSERVAR AS ESTRELAS, DESCOBRIR PLANETAS E TALVEZ ATÉ ENCONTRAR NOVOS MISTÉRIOS A SEREM DESVENDADOS.

O MEU 'SUMIÇO' FOI UMA FORMA DE ME DEDICAR A UMA NOVA PESQUISA, LONGE DOS OLHARES CURIOSOS. ESTUDEI AS ESTRELAS, E ELAS ME REVELARAM A BELEZA DE NOSSO UNIVERSO. ESPERO QUE VOCÊ FAÇA O MESMO. O VERDADEIRO TESOURO ESTÁ NA BUSCA, NA AVENTURA E NA DESCOBERTA.

COM CARINHO E VOTOS DE MUITAS DESCOBERTAS, SR. SABICHÃO.

BIA RELEU A CARTA, UM SORRISO SURGINDO EM SEU ROSTO. O SR. SABICHÃO NÃO HAVIA DESAPARECIDO, ELE ESTAVA EXPLORANDO! E O TESOURO... O TESOURO ERA AINDA MAIS INCRÍVEL DO QUE ELA IMAGINAVA. NÃO ERA ALGO QUE SE PUDESSE GUARDAR EM UM BAÚ, MAS ALGO QUE SE PODIA USAR PARA VER O INFINITO.

AO LADO DA CARTA, HAVIA UM ÚLTIMO BILHETE: " O CADERNO CONTÉM MINHAS ANOTAÇÕES SOBRE AS CONSTELAÇÕES MAIS IMPORTANTES. COMECE POR ELE."

COM O CORAÇÃO CHEIO DE ALEGRIA E UMA NOVA PAIXÃO BORBULHANDO, BIA ABRAÇOU ZECA. ELES NÃO TINHAM ENCONTRADO OURO, MAS TINHAM DESCOBERTO ALGO MUITO MAIS VALIOSO: A AVENTURA DO CONHECIMENTO. O ESQUELETO NO ARMÁRIO NÃO ERA UM AVISO DE PERIGO, MAS SIM O PONTO DE PARTIDA PARA UMA JORNADA INESGOTÁVEL.

BIA E ZECA VOLTARAM PARA CASA COM O TELESCÓPIO, O CADERNO E UM MAPA DAS ESTRELAS EM SUAS MENTES. A PARTIR DAQUELE DIA, AS NOITES EM SERRAVISTA NUNCA MAIS FORAM AS MESMAS PARA A PEQUENA BIA. ELA PASSAVA HORAS EM SEU QUINTAL, OBSERVANDO AS ESTRELAS, DESENHANDO CONSTELAÇÕES E IMAGINANDO OS MUNDOS DISTANTES. O MISTÉRIO DO SR. SABICHÃO A HAVIA LEVADO A UM TESOURO MUITO MAIOR DO QUE ELA JAMAIS PODERIA TER SONHADO. O ESQUELETO NO ARMÁRIO TINHA SIDO APENAS O INÍCIO DE SUA PRÓPRIA  AVENTURA CÓSMICA.