NUM CASTELO FEITO DE PEDRAS CLARAS, ENCRAVADO NO TOPO DAS MONTANHAS DE CHIPRE, VIVIA UMA JOVEM PRINCESA CHAMADA ELARA. O CASTELO SE ERGUIA TÃO ALTO QUE, AO ANOITECER, PARECIA TOCAR AS ESTRELAS. A CADA NOITE, ELARA SUBIA SOZINHA ATÉ A TORRE MAIS ALTA, ONDE HAVIA UM PEQUENO TERRAÇO COM UM TELESCÓPIO ANTIGO, PRESENTE DE SEU AVÔ, O REI FILIPO.

DESDE MUITO PEQUENA, ELARA TINHA UMA PAIXÃO QUE NINGUÉM EM TODO O REINO ENTENDIA COMPLETAMENTE: ELA AMAVA OLHAR AS ESTRELAS, DESCOBRIR CONSTELAÇÕES, TRAÇAR OS DESENHOS DO CÉU COM O DEDO NO AR E IMAGINAR HISTÓRIAS SOBRE OS PLANETAS DISTANTES.

— ELARA, VENHA PARA O SALÃO! — CHAMAVA SUA MÃE, A RAINHA AMARA, TODAS AS NOITES, ESPERANDO A FILHA PARA OS JANTARES REAIS.

MAS A PRINCESA RARAMENTE DESCIA. FICAVA ALI, COM A CAPA AZUL-MARINHO QUE O ALFAIATE DO REINO FIZERA ESPECIALMENTE PARA ELA, BORDADA COM FIOS PRATEADOS QUE DESENHAVAM ESTRELAS CADENTES.

SEU MAIOR DESEJO ERA UM DIA VIAJAR ATÉ AS ESTRELAS. SABIA QUE AQUILO ERA IMPOSSÍVEL, MAS NÃO SE IMPORTAVA. SONHAR JÁ ERA QUASE O MESMO QUE VIVER. E, PARA ELARA, OS SONHOS ERAM TÃO IMPORTANTES QUANTO O PRÓPRIO AR QUE RESPIRAVA.

CERTA NOITE DE PRIMAVERA, UMA BRISA SUAVE SOPRAVA PELAS JANELAS DA TORRE. A LUA CHEIA BRILHAVA COMO NUNCA, TÃO GRANDE QUE PARECIA UM ESPELHO FLUTUANTE. ELARA, ENCANTADA, SUBIU MAIS UMA VEZ ATÉ O TERRAÇO. SENTOU-SE NA CADEIRA DE FERRO FORJADO E FICOU EM SILÊNCIO, OLHANDO PARA A LUA.

ENTÃO, COM A VOZ MAIS DOCE QUE CONSEGUIU ENCONTRAR, SUSSURROU:

— QUERIDA LUA... SE VOCÊ ME ESCUTA, POR FAVOR, ME CONCEDA UM DESEJO. QUERO DORMIR E SONHAR PARA SEMPRE COM AS COISAS MAIS BONITAS DO MUNDO.

FECHOU OS OLHOS, FEZ O PEDIDO COM TODA A FORÇA DO CORAÇÃO E, DEPOIS DE ALGUNS MINUTOS, VOLTOU PARA O SEU QUARTO, ONDE ADORMECEU TRANQUILA.

NAQUELA NOITE, ELARA TEVE O SONHO MAIS LINDO DE TODA A SUA VIDA. SONHOU QUE CAMINHAVA POR UM CAMPO DE ESTRELAS, COM FLORES DOURADAS QUE SE ABRIAM AO TOQUE DE SEUS PÉS. AS NUVENS ERAM FEITAS DE ALGODÃO-DOCE, E HAVIA PÁSSAROS TRANSPARENTES QUE CANTAVAM CANÇÕES QUE ELA NUNCA OUVIRA, MAS QUE SABIA DE COR. NO MEIO DE TUDO, UMA PONTE DE CRISTAL LEVAVA ATÉ UM LAGO ONDE A LUA DESCANSAVA, MERGULHADA NAS ÁGUAS PRATEADAS.

QUANDO ACORDOU, AINDA PODIA SENTIR O PERFUME DAS FLORES DO SONHO. OLHOU PELA JANELA: O CÉU AINDA ESTAVA CLARO, MAS NÃO TANTO QUANTO NO SONHO. SORRIU, FELIZ.

OS DIAS SE PASSARAM, E ELARA PERCEBEU QUE, TODAS AS NOITES, SEMPRE QUE FECHAVA OS OLHOS, VOLTAVA A SONHAR COM AQUELE MESMO LUGAR. A CADA SONHO, O CAMPO DE ESTRELAS SE TORNAVA MAIS BONITO, AS FLORES MUDAVAM DE COR E NOVOS ANIMAIS SURGIAM: CERVOS DE NÉVOA, BORBOLETAS DE LUZ, PEQUENOS DRAGÕES DOURADOS QUE SOLTAVAM FAGULHAS DE ALEGRIA.

DURANTE O DIA, CONTAVA SUAS AVENTURAS PARA OS CRIADOS DO CASTELO, PARA O JARDINEIRO, PARA O COZINHEIRO, PARA OS GUARDAS..., MAS NINGUÉM PARECIA ENTENDER A PROFUNDIDADE DAQUELES SONHOS.

— VOCÊ TEM UMA IMAGINAÇÃO MARAVILHOSA, PRINCESA — DIZIA A AMA, SORRINDO, ENQUANTO PENTEAVA OS CABELOS LONGOS DE ELARA.

MAS PARA ELARA, NÃO ERA APENAS IMAGINAÇÃO. ERA COMO SE, DE ALGUMA FORMA MISTERIOSA, O PEDIDO QUE FIZERA À LUA TIVESSE REALMENTE SE REALIZADO. AGORA, ELA PODIA IR PARA AQUELE MUNDO DE BELEZA INFINITA SEMPRE QUE DORMIA.

S MESES PASSARAM. O REI FILIPO COMEÇOU A NOTAR QUE A FILHA PASSAVA MAIS TEMPO DORMINDO DO QUE ACORDADA. AS AULAS COM OS TUTORES, AS REFEIÇÕES EM FAMÍLIA E ATÉ AS FESTAS REAIS PASSARAM A SER IGNORADAS POR ELARA, QUE CORRIA PARA O QUARTO SEMPRE QUE PODIA, ANSIOSA PARA ADORMECER E ENCONTRAR NOVAMENTE SEU MUNDO DE SONHOS.

PREOCUPADO, O REI CHAMOU O CURANDEIRO DO REINO, QUE EXAMINOU A PRINCESA COM TODOS OS SEUS INSTRUMENTOS DE MADEIRA E PRATA.

— SUA ALTEZA ESTÁ SAUDÁVEL. APENAS... SONHA MUITO — DISSE O CURANDEIRO, COÇANDO A BARBA GRISALHA.

O REI E A RAINHA, APESAR DO ALÍVIO, CONTINUAVAM INQUIETOS. AFINAL, ELARA PARECIA CADA VEZ MAIS DISTANTE DO MUNDO REAL, COMO SE O CASTELO, AS MONTANHAS E ATÉ A PRÓPRIA FAMÍLIA TIVESSEM PERDIDO IMPORTÂNCIA PARA ELA.

 NUMA NOITE ESPECIALMENTE FRIA, ELARA SUBIU NOVAMENTE À TORRE PARA OLHAR A LUA, QUE BRILHAVA TÍMIDA ENTRE AS NUVENS.

— QUERIDA LUA... — SUSSURROU. — POR QUE MEU CORAÇÃO QUER TANTO VIVER NOS MEUS SONHOS? POR QUE NÃO CONSIGO SER TÃO FELIZ AQUI QUANTO SOU LÁ?

A LUA, SILENCIOSA COMO SEMPRE, NÃO RESPONDEU.

MAS, DE REPENTE, UMA LUZ SUAVE, AZULADA, APARECEU NO MEIO DO TERRAÇO. A LUZ SE TRANSFORMOU, AOS POUCOS, NUMA FIGURA DELICADA: UMA MULHER VESTIDA DE VÉUS TRANSPARENTES, COM CABELOS LONGOS QUE PARECIAM FEITOS DE RAIOS DE LUAR.

— QUEM... QUEM É VOCÊ? — PERGUNTOU ELARA, COM OS OLHOS ARREGALADOS.

— SOU SELENE, A GUARDIÃ DOS SONHOS — DISSE A MULHER, COM UMA VOZ QUE PARECIA O VENTO TOCANDO FOLHAS SECAS. — ESCUTEI SEU PEDIDO NAQUELA NOITE. FUI EU QUEM LHE CONCEDEU O PRESENTE DE SONHAR PARA SEMPRE.

— ENTÃO FOI REAL? — ELARA EXCLAMOU, SORRINDO. — EU SABIA!

SELENE ASSENTIU.

— MAS VIM AVISÁ-LA, MINHA QUERIDA PRINCESA: TODO PRESENTE TEM TAMBÉM UM PREÇO.

— UM PREÇO?

SELENE SE APROXIMOU E SEGUROU SUAVEMENTE AS MÃOS DE ELARA.

— SE CONTINUAR A ESCOLHER OS SONHOS, PODERÁ, UM DIA, NÃO MAIS CONSEGUIR ACORDAR. O MUNDO DOS SONHOS É BELO, MAS ELE NÃO É REAL. AQUI, ONDE VIVEM AS PESSOAS QUE AMAM VOCÊ, ONDE EXISTEM O CHEIRO DAS FLORES VERDADEIRAS, O CALOR DO SOL, OS ABRAÇOS SINCEROS... ESTE É O MUNDO ONDE SUA ALMA PERTENCE.

ELARA FICOU EM SILÊNCIO, OLHANDO PARA O CHÃO DE PEDRAS FRIAS DO TERRAÇO. NUNCA TINHA PENSADO NISSO. SERÁ QUE ESTAVA MESMO ABANDONANDO SUA VIDA REAL?

— EU... NÃO SEI O QUE ESCOLHER — CONFESSOU, COM OS OLHOS MAREJADOS.

SELENE SORRIU COM DOÇURA E SE DISSOLVEU LENTAMENTE NO AR, DEIXANDO APENAS UM SUSSURRO:

— SÓ O SEU CORAÇÃO PODE DECIDIR.

NAQUELA NOITE, ELARA DESCEU DA TORRE E FOI ATÉ OS APOSENTOS DO PAI, O REI. ENCONTROU-O LENDO UM LIVRO ANTIGO, COM UMA LAREIRA CREPITANDO AO FUNDO.

— PAPAI... POSSO FICAR AQUI COM VOCÊ UM POUCO? — PERGUNTOU, TÍMIDA.

O REI LARGOU O LIVRO IMEDIATAMENTE E ABRIU OS BRAÇOS.

— SEMPRE, MINHA FILHA.

ELARA SE ACONCHEGOU AO PAI E, PELA PRIMEIRA VEZ EM MESES, FICOU ACORDADA ATÉ TARDE, APENAS OUVINDO AS HISTÓRIAS DE QUANDO O REI ERA JOVEM E EXPLORAVA AS FLORESTAS AO REDOR DO CASTELO.

SENTIU-SE AQUECIDA, AMADA E... VIVA.

NOS DIAS SEGUINTES, ELARA COMEÇOU A DESCER MAIS VEZES DAS TORRES. PASSEOU PELOS JARDINS, AJUDOU O JARDINEIRO A PLANTAR NOVAS MUDAS DE ROSAS, BRINCOU COM OS CAVALOS DO ESTÁBULO E ATÉ VOLTOU A TER AULAS COM SEUS TUTORES.

MAS À NOITE, OS SONHOS CONTINUAVAM.

O CAMPO DE ESTRELAS, AS FLORES DOURADAS, OS CERVOS DE NÉVOA... TUDO AINDA ESTAVA LÁ, ESPERANDO POR ELA. NO ENTANTO, AGORA ELARA NÃO TINHA MAIS TANTA PRESSA PARA VOLTAR PARA AQUELE MUNDO. PERCEBIA, COM CLAREZA CRESCENTE, QUE AQUILO ERA BELO, MAS NÃO ERA O BASTANTE.

QUERIA TAMBÉM OUVIR A RISADA DA COZINHEIRA QUANDO QUEIMAVA O PÃO, SENTIR O VENTO GELADO DO ALTO DAS MONTANHAS E O CARINHO DA MÃE QUANDO LHE FAZIA TRANÇAS NO CABELO.

O TEMPO PASSOU, E ELARA APRENDEU A EQUILIBRAR OS DOIS MUNDOS. TODAS AS NOITES, ADORMECIA E VISITAVA OS SONHOS. TODAS AS MANHÃS, ACORDAVA E VIVIA A BELEZA DO MUNDO REAL.

ALGUNS ANOS DEPOIS, QUANDO CRESCEU, TORNOU-SE RAINHA DE CHIPRE. ERA UMA RAINHA SÁBIA E GENTIL, QUE GOVERNAVA COM JUSTIÇA E BONDADE. MUITAS VEZES SUBIA ATÉ A TORRE PARA OLHAR A LUA, AGORA COM SEUS PRÓPRIOS FILHOS AO LADO, CONTANDO-LHES AS HISTÓRIAS DO CAMPO DE ESTRELAS, DAS FLORES DOURADAS E DOS CERVOS DE NÉVOA.

SEUS FILHOS RIAM E DIZIAM:

— MAMÃE, QUE HISTÓRIAS LINDAS! VOCÊ SONHOU TUDO ISSO?

E ELA, SORRINDO, RESPONDIA:

— SIM, EU SONHEI..., MAS TAMBÉM VIVI. E APRENDI QUE OS SONHOS SÃO IMPORTANTES, MAS O MAIS BONITO DE TUDO É QUANDO CONSEGUIMOS TRANSFORMAR A BELEZA DOS SONHOS EM ALGO REAL, AQUI, COM QUEM AMAMOS.

E ASSIM, NO CASTELO NO TOPO DAS MONTANHAS DE CHIPRE, ELARA VIVEU MUITOS E MUITOS ANOS, SEMPRE COM A LUA COMO SUA AMIGA SILENCIOSA, GUARDANDO SEUS SONHOS E LEMBRANDO, TODAS AS NOITES, DO DIA EM QUE PEDIU PARA SONHAR PARA SEMPRE.

E, DE CERTA FORMA, SEU PEDIDO FOI ATENDIDO. MAS NÃO COMO ELA IMAGINAVA.

POIS ELARA NÃO APENAS SONHOU COM AS COISAS MAIS BONITAS DO MUNDO... ELA AS VIVEU.

NUMA NOITE EM QUE O VENTO SOPRAVA FORTE PELAS JANELAS DO CASTELO, ELARA, JÁ HABITUADA A EQUILIBRAR SEUS DIAS ENTRE A REALIDADE E OS SONHOS, SENTIU ALGO DIFERENTE. AO DEITAR-SE, UM FRIO PERCORREU SUA ESPINHA E, ANTES MESMO QUE O SONO A ENVOLVESSE POR COMPLETO, PERCEBEU QUE ESTAVA SENDO PUXADA POR UMA FORÇA INVISÍVEL, COMO UM FIO DE SEDA DOURADO QUE SE ENROLAVA EM SEU PULSO E A GUIAVA PARA ALÉM DO VÉU DA CONSCIÊNCIA.

QUANDO ABRIU OS OLHOS, NÃO ESTAVA MAIS EM SEU QUARTO DE CORTINAS LILASES, MAS SIM NO CORAÇÃO DO MUNDO DOS SONHOS.

DESTA VEZ, NÃO ERA O CAMPO DE ESTRELAS HABITUAL. O CÉU AINDA ERA SALPICADO DE CONSTELAÇÕES VIVAS, MAS À SUA FRENTE ERGUIA-SE UM PORTAL COLOSSAL, FEITO DE UMA PEDRA QUE PULSAVA COMO UM CORAÇÃO. GRAVURAS EM ESPIRAL SE MOVIAM LENTAMENTE PELA SUPERFÍCIE, E UMA NÉVOA PRATEADA SAÍA POR ENTRE AS FRESTAS.

UMA FIGURA CONHECIDA AGUARDAVA À ENTRADA: SELENE, A GUARDIÃ DOS SONHOS.

— EU SABIA QUE VOCÊ VIRIA — DISSE SELENE, COM UM SORRISO TRANQUILO.

— O QUE É ESTE LUGAR? — PERGUNTOU ELARA, ENCANTADA E UM POUCO APREENSIVA.

— É O LIMIAR. O PONTO MAIS PROFUNDO DO MUNDO DOS SONHOS. POUCOS MORTAIS CHEGAM ATÉ AQUI — RESPONDEU SELENE, ERGUENDO O BRAÇO E APONTANDO PARA O PORTAL. — AQUI, OS SONHOS PODEM SE TORNAR ETERNOS. AO ATRAVESSÁ-LO, NUNCA MAIS PRECISARÁ ACORDAR. SERÁ A SENHORA DESTE REINO, E TUDO O QUE IMAGINAR SE TORNARÁ REAL.

ELARA ARREGALOU OS OLHOS.

— NUNCA MAIS ACORDAR?

SELENE ASSENTIU.

— NÃO HAVERÁ MAIS INVERNOS FRIOS, NEM DESPEDIDAS, NEM TRISTEZAS. APENAS A BELEZA DOS SONHOS... PARA SEMPRE.

A PRINCESA FICOU EM SILÊNCIO, FITANDO O PORTAL. LÁ DENTRO, PODIA VER REFLEXOS DE PAISAGENS QUE SÓ EXISTIAM NA IMAGINAÇÃO: BOSQUES FLUTUANTES, RIOS DE LUZ LÍQUIDA, CASTELOS FEITOS DE CRISTAL E CAVALOS ALADOS QUE GALOPAVAM PELAS NUVENS.

DEU UM PASSO À FRENTE. A IDEIA ERA TENTADORA. NÃO PRECISARIA MAIS LIDAR COM AS INCERTEZAS DO MUNDO REAL, NEM COM AS DESPEDIDAS OU COM A DOR. APENAS PAZ, BELEZA E LIBERDADE SEM LIMITES.

MAS ENTÃO, COMO UM SOPRO, LEMBROU-SE DA TARDE EM QUE AJUDARA O JARDINEIRO A PLANTAR ROSEIRAS, DO ABRAÇO QUENTE DO PAI JUNTO À LAREIRA, DA RISADA DA MÃE AO VÊ-LA TROPEÇAR NA SAIA DO VESTIDO.

E, MAIS FORTE AINDA, RECORDOU-SE DO DIA EM QUE, NA TORRE, OUVIRA SELENE LHE DIZER:
"O MUNDO DOS SONHOS É BELO, MAS NÃO É REAL..."

ELARA RECUOU UM PASSO.

— NÃO SEI SE DEVO ATRAVESSAR — CONFESSOU.

SELENE SE APROXIMOU E, SUAVEMENTE, TOCOU O OMBRO DA PRINCESA.

— NÃO ESTOU AQUI PARA DECIDIR POR VOCÊ, ELARA. SÓ VOCÊ PODE FAZER ESSA ESCOLHA.

— MAS E SE EU ATRAVESSAR E ME ARREPENDER?

— NÃO HAVERÁ ARREPENDIMENTO, POIS NÃO HAVERÁ MAIS CONSCIÊNCIA DO QUE ABANDONOU — RESPONDEU SELENE, SERENA. — SERÁ COMO SE ESSE OUTRO MUNDO JAMAIS TIVESSE EXISTIDO.

ELARA SENTIU UMA LÁGRIMA QUENTE ESCORRER PELO ROSTO. O PORTAL PULSAVA MAIS FORTE, COMO SE SOUBESSE QUE ELA ESTAVA PRESTES A DECIDIR.

FECHOU OS OLHOS E RESPIROU FUNDO.

ENTÃO, COM A VOZ FIRME, DISSE:

— NÃO. AINDA NÃO. QUERO VOLTAR.

SELENE SORRIU, COMO QUEM JÁ ESPERAVA AQUELA RESPOSTA, E COM UM GESTO SUAVE, DISSOLVEU O PORTAL EM MILHARES DE PONTOS DE LUZ.

— VOCÊ ESCOLHEU SABIAMENTE, PRINCESA DOS SONHOS E DA REALIDADE — DISSE A GUARDIÃ. — E QUANDO QUISER, ESTAREI SEMPRE AQUI.

ELARA ACORDOU COM O CORAÇÃO ACELERADO, AS MÃOS APERTANDO OS LENÇÓIS COMO SE SEGURASSEM ALGO PRECIOSO. LEVANTOU-SE DA CAMA E CORREU ATÉ A JANELA DE SEU QUARTO.

A LUA ESTAVA LÁ, COMO SEMPRE, SILENCIOSA E BRILHANTE.

MAS, NAQUELA NOITE, PARECIA SORRIR PARA ELA.

NA MANHÃ SEGUINTE, E LARA DESCEU PARA O SALÃO DO CASTELO E, PELA PRIMEIRA VEZ EM MUITO TEMPO, PEDIU AO COZINHEIRO QUE PREPARASSE O SEU BOLO FAVORITO DE MEL E AMÊNDOAS.

DEPOIS, CAVALGOU PELOS CAMPOS COM OS GUARDAS, COLHEU FLORES SILVESTRES COM A MÃE, E, AO ENTARDECER, SUBIU ATÉ A TORRE COM O PAI PARA OLHAR JUNTOS AS ESTRELAS.

AGORA, ELA SABIA:
NÃO PRECISAVA ABANDONAR O MUNDO REAL PARA VIVER COISAS BELAS.
OS SONHOS CONTINUARIAM LÁ, ESPERANDO POR ELA A CADA NOITE, MAS O DIA... O DIA ERA UM PRESENTE AINDA MAIS PRECIOSO.

E ASSIM, ELARA VIVEU COM EQUILÍBRIO ENTRE OS DOIS MUNDOS: O DOS SONHOS INFINITOS E O DA REALIDADE QUE PODIA SER TOCADO E SEMPRE LIVRE PARA VISITAR O QUE MAIS AMAVA, SEM JAMAIS PERDER QUEM REALMENTE ERA.