HÁ MUITOS ANOS, TRÊS IRMÃOS CONSTRUÍAM UMA FORTALEZA GIGANTE NO ALTO DA MONTANHA DO ECO. ELES SE CHAMAVAM LUNO, PIPO E NARA. LUNO ERA O MAIS VELHO E GOSTAVA DE BRINCAR COM PEDRAS ENORMES, QUE ELE EMPILHAVA COM FACILIDADE. PIPO ERA O DO MEIO, VIVIA COM UM MAPA NA MÃO E FALAVA COM OS ESQUILOS PARA SABER OS SEGREDOS DA FLORESTA. E NARA ERA A MENOR, MAS A MAIS CORAJOSA. ELA FALAVA COM O VENTO E OUVIA O QUE AS NUVENS DIZIAM.

DENTRO DA MONTANHA, ESCONDIDO NO CORAÇÃO DA TERRA, MORAVA UM DRAGÃO GIGANTE. O NOME DELE ERA FUMAZUL, PORQUE SUA FUMAÇA SAÍA AZULZINHA, PERFUMADA COMO FLOR. FUMAZUL DORMIA ENROLADO EM PEDRAS QUENTES E SONHAVA COM OS TEMPOS EM QUE VOAVA LIVRE PELOS CÉUS. MAS AGORA ELE FICAVA ALI, QUIETO, COM MEDO DE MACHUCAR OS HUMANOS, PORQUE, UMA VEZ, SEM QUERER, QUEIMOU UMA VILA INTEIRA ESPIRRANDO.

OS TRÊS IRMÃOS NÃO SABIAM DISSO. ELES CONSTRUÍAM A FORTALEZA PORQUE OUVIRAM FALAR DO TESOURO ESCONDIDO DO DRAGÃO. NARA, NO FUNDO, NÃO QUERIA OURO. ELA QUERIA ENTENDER POR QUE O VENTO SEMPRE SUSSURRAVA O NOME FUMAZUL QUANDO PASSAVA PELA MONTANHA.

UM DIA, ENQUANTO COLOCAVAM PEDRAS NOVAS NA TORRE MAIS ALTA, O CÉU ESCURECEU DE REPENTE. UMA NUVEM CINZA GRANDONA CHEGOU RUGINDO! TROVÕES PULAVAM ENTRE AS MONTANHAS, E A CHUVA DESCEU EM PINGOS TÃO GROSSOS QUE PARECIAM BALAS DE GELATINA. NARA CORREU PRA DENTRO DA TORRE, MAS, ANTES DE ENTRAR, VIU UMA COISA MUITO ESQUISITA.

UM PÁSSARO NEGRO, COM PENAS BRILHANTES COMO SOMBRA MOLHADA, APARECEU VOANDO BAIXO. ELE CANTAVA UMA CANÇÃO QUE ARREPIAVA A ALMA. ERA UMA MÚSICA TRISTE, QUE FAZIA AS PEDRAS CHORAREM E O VENTO PARAR. NARA SEGUIU O CANTO. DESCEU AS ESCADAS DA TORRE, SAIU PELA PARTE DE TRÁS DA FORTALEZA E ENCONTROU, NUMA LAGOA ESCONDIDA, UMA SEREIA. ELA TINHA CABELOS TÃO LONGOS QUE NADAVAM POR CONTA PRÓPRIA, E OLHOS TÃO TRISTES QUE PARECIAM TER PERDIDO O SOL PARA SEMPRE.

A SEREIA SE CHAMAVA LIRA. O PÁSSARO, PAURA. ELES SE AMAVAM. NARA NÃO ENTENDIA COMO ISSO ERA POSSÍVEL. “UM PÁSSARO E UMA SEREIA?” MAS LOGO ENTENDEU: ELES TINHAM UM AMOR SECRETO, ESCONDIDO DAS CRIATURAS DO MUNDO, PORQUE OS REINOS DO AR E DA ÁGUA BRIGAVAM FAZIA MUITO TEMPO. UM DIA, ELES FORAM DESCOBERTOS POR UM REI DOS CORVOS E UMA RAINHA DOS OCEANOS. E FORAM SEPARADOS COM FEITIÇOS DE ESQUECIMENTO.

MAS PAURA NÃO ESQUECEU. E NEM LIRA. ELES CANTAVAM UM PARA O OUTRO NAS TEMPESTADES. ERA O ÚNICO MOMENTO EM QUE O AR E A ÁGUA SE ENCONTRAVAM.

NARA FICOU TÃO TOCADA COM AQUILO QUE PROMETEU AJUDAR. MAS SÓ UM FEITICEIRO PODERIA QUEBRAR OS FEITIÇOS. ENTÃO ELA PROCUROU NO LIVRO DAS VOZES, QUE FICAVA ESCONDIDO NA BIBLIOTECA DA NOITE, DENTRO DO TRONCO DE UMA ÁRVORE QUE NINGUÉM VIA. COM A AJUDA DOS ESQUILOS DE PIPO, ELA ACHOU O LIVRO. E LEU:

“O FEITICEIRO QUE PODE UNIR O QUE FOI SEPARADO ESTÁ DORMINDO NAS CINZAS DO DRAGÃO. ACORDE O FOGO ANTIGO, E O FEITICEIRO VIRÁ.”

NARA CORREU CONTAR PARA OS IRMÃOS. ELES RIRAM. “FEITICEIRO NAS CINZAS? ISSO É PAPO DE VENTO!” DISSE LUNO. MAS NARA FOI ASSIM MESMO. DESCEU SOZINHA ATÉ A CAVERNA ONDE DORMIA FUMAZUL.

LÁ DENTRO, ESTAVA QUENTE COMO FORNO DE PIZZA. NARA SE APROXIMOU DO DRAGÃO COM MUITO CUIDADO. ELA LEVOU UMA FLAUTA FEITA DE GALHO DE SALGUEIRO E TOCOU UMA MÚSICA DOCE. FUMAZUL ABRIU OS OLHOS. ELES ERAM DO TAMANHO DE BOLAS DE SABÃO, MAS CHEIOS DE CHAMAS SUAVES.

“QUEM CANTA PRA MIM?” ELE DISSE, COM VOZ DE TROVÃO CANSADO.

NARA SE APRESENTOU. CONTOU SOBRE LIRA, PAURA, O AMOR, O FEITIÇO. E LEU O TRECHO DO LIVRO.

FUMAZUL SE ARREPIOU. ELE SE LEVANTOU, E CINZAS CAÍRAM DAS SUAS ESCAMAS. QUANDO ESPIRROU, UMA NUVEM DE CINZA RODOPIOU E VIROU... UM FEITICEIRO!

ERA UM VELHINHO COM CAPA DE FUMAÇA, BARBA DE ESTRELAS E OLHOS QUE PISCAVAM RAIO. SEU NOME ERA TINDARO. ELE NASCEU DAS LÁGRIMAS DO PRIMEIRO DRAGÃO DO MUNDO. E SÓ PODIA APARECER QUANDO UM CORAÇÃO PURO ACORDASSE FUMAZUL.

TINDARO DISSE QUE PRECISAVA DE TRÊS COISAS PARA DESFAZER O FEITIÇO: UMA LÁGRIMA DA SEREIA, UMA PENA DO PÁSSARO E UM RAIO PRESO NO TOPO DA MONTANHA. NARA PARTIU PARA CONSEGUIR TUDO.

ELA PRIMEIRO FOI À LAGOA E PEDIU A LIRA UMA LÁGRIMA. LIRA CHOROU UMA GOTA BRILHANTE COMO CRISTAL E DEU A NARA NUM FRASCO DE CONCHA.

DEPOIS, VOOU NAS COSTAS DE PAURA ATÉ O PICO DO ECO. LÁ, UMA TEMPESTADE MORAVA O TEMPO TODO. PAURA VOOU TÃO RÁPIDO QUE UM RAIO PEGOU CARONA NA SUA CAUDA. QUANDO POUSARAM, A ELETRICIDADE ESTALAVA NO AR COMO PIPOCA.

NARA USOU UM FRASCO DE VIDRO ENCANTADO PARA GUARDAR O RAIO. DEPOIS, COM JEITINHO, PEDIU UMA PENA DE PAURA. ELE DEU UMA PRETA, COM BRILHO DE NOITE MOLHADA.

COM TUDO EM MÃOS, VOLTOU PARA A CAVERNA. TINDARO MISTUROU TUDO NUM CALDEIRÃO DE PEDRA, MURMUROU PALAVRAS EM IDIOMA DE ESTRELAS E JOGOU A POÇÃO NO AR.

UM BRILHO EXPLODIU. UMA VENTANIA GIROU. E ENTÃO, DE REPENTE, LIRA E PAURA ESTAVAM LADO A LADO. NUMA PRAIA ESCONDIDA, ONDE O MAR BEIJAVA O CÉU. E ELES SE ABRAÇARAM COM TANTA ALEGRIA QUE O MUNDO GIROU MAIS RÁPIDO POR UM SEGUNDO.

MAS ALGO ESTAVA ERRADO. OS REIS QUE TINHAM SEPARADO OS DOIS SENTIRAM O FEITIÇO QUEBRAR. E MANDARAM SEUS EXÉRCITOS. DO MAR, VIERAM ONDAS COM DENTES E PEIXES ARMADOS COM LANÇAS DE CORAIS. DO CÉU, VIERAM CORVOS DE ARMADURAS DE TROVÃO E OLHOS VERMELHOS.

NARA SE COLOCOU ENTRE ELES E OS DOIS AMANTES. TINDARO DEU A ELA UMA CAPA DE VENTO, UMA ESPADA FEITA DE LUA E UM ESCUDO DE ÁGUA-VIVA.

A BATALHA FOI ENORME. LUNO E PIPO APARECERAM NO MEIO DA CONFUSÃO, LUTANDO COM BALDES DE PEDRAS E MAPAS QUE VIRAVAM ARMADILHAS. FUMAZUL VOOU DEPOIS DE MIL ANOS, CUSPIU FUMAÇA AZUL QUE FAZIA OS INIMIGOS DORMIREM.

NARA ENFRENTOU O REI DOS CORVOS, QUE VOAVA COMO UM RAIO PRETO. ELES LUTARAM NO AR, ESPADAS TILINTANDO COMO SINOS ASSUSTADOS. ELA GRITOU TÃO FORTE QUE O VENTO VIROU FURACÃO E DERRUBOU A CORUJA GUERREIRA DO CÉU.

LIRA CHAMOU AS ONDAS. PAURA TROUXE AS NUVENS. E JUNTOS, FIZERAM O AMOR DELES BRILHAR TÃO FORTE QUE OS EXÉRCITOS FICARAM CEGOS DE LUZ. QUANDO VOLTARAM A ENXERGAR, ESQUECERAM PORQUE LUTAVAM.

O REI DOS CORVOS BATEU ASAS E SUMIU. A RAINHA DO OCEANO AFUNDOU NUM REDEMOINHO. E OS DOIS NUNCA MAIS VOLTARAM.

DEPOIS DA GRANDE BATALHA, A MONTANHA DO ECO VOLTOU A BRILHAR SOB O SOL E A LUA. LIRA E PAURA, FINALMENTE LIVRES, DECIDIRAM CONSTRUIR UM LAR ONDE O AR E A ÁGUA SE ENCONTRASSEM — UMA ILHA FLUTUANTE NO MEIO DO LAGO ESCONDIDO, FEITA DE NUVENS E CONCHAS.

NARA, LUNO E PIPO VOLTARAM PARA A FORTALEZA, AGORA AINDA MAIOR, MAS DIFERENTE. NÃO ERA MAIS SÓ UMA CONSTRUÇÃO DE PEDRAS; ERA UM LUGAR ONDE O VENTO CANTAVA ENTRE AS TORRES, ONDE OS ESQUILOS TRAZIAM NOTÍCIAS DA FLORESTA E ONDE O FOGO AZUL DE FUMAZUL ILUMINAVA AS NOITES COM CALMA.

MAS, COM A PAZ, NOVAS PERGUNTAS SURGIRAM.

— O QUE O FEITICEIRO TINDARO FARÁ AGORA QUE DESPERTOU? — PERGUNTOU PIPO, OLHANDO SEU MAPA QUE MOSTRAVA LUGARES ALÉM DA MONTANHA DO ECO.

— ELE DEVE CUIDAR DO DRAGÃO — RESPONDEU LUNO, AJEITANDO UMA PEDRA NO MURO.

NARA, PORÉM, SENTIA QUE SUA MISSÃO NÃO HAVIA TERMINADO. AS NUVENS CONTINUAVAM SUSSURRANDO, E O VENTO AINDA TRAZIA ECOS DE OUTROS REINOS DISTANTES.

UMA NOITE, ENQUANTO A LUA CHEIA ILUMINAVA A FORTALEZA, UM BRILHO SURGIU ENTRE AS PEDRAS. ERA UM CRISTAL AZUL, TÃO PURO QUE PARECIA GUARDAR A PRÓPRIA ESSÊNCIA DO CÉU.

DE REPENTE, UMA VOZ SUAVE VEIO DO CRISTAL:

— NARA... O EQUILÍBRIO ENTRE OS REINOS FOI RESTAURADO, MAS OUTROS MISTÉRIOS ESPERAM POR VOCÊ. O MUNDO ESTÁ CHEIO DE VOZES QUE PRECISAM SER OUVIDAS.

NARA SEGUROU O CRISTAL COM CUIDADO. ELA SABIA QUE A VERDADEIRA AVENTURA APENAS COMEÇAVA.

— IRMÃOS — CHAMOU ELA —, O MUNDO LÁ FORA ESTÁ CHEIO DE HISTÓRIAS, E EU SINTO QUE É HORA DE ESCUTÁ-LAS. VAMOS JUNTOS?

LUNO SORRIU, PEGANDO UMA PEDRA LUMINOSA.

— VAMOS CONSTRUIR PONTES, NÃO SÓ DE PEDRAS, MAS DE HISTÓRIAS.

PIPO GUARDOU O MAPA.

— E DESVENDAR OS SEGREDOS QUE O VENTO AINDA TRAZ.

JUNTOS, OS TRÊS IRMÃOS OLHARAM PARA O HORIZONTE, ONDE O CÉU BEIJAVA A TERRA, PRONTOS PARA NOVAS JORNADAS, GUIADOS PELO ECO DAS VOZES QUE SÓ QUEM TEM CORAGEM CONSEGUE OUVIR.