NUM SÍTIO MUITO ESPAÇOSO CHAMADO RECANTO DO SOL, MORAVAM CENTENAS DE GALINHAS. ERAM TODAS MUITO TRABALHADORAS, DEDICADAS E — COMO QUALQUER BOA GALINHA DO CAMPO — BOTAVAM OVOS COM REGULARIDADE. ENTRE TODAS, HAVIA UMA QUE SE DESTACAVA. NÃO POR BOTAR OS MAIORES OVOS OU POR CANTAR O CACAREJO MAIS BONITO AO AMANHECER, MAS POR SER... DIGAMOS... UM TANTO VAIDOSA E IMPLICANTE.

O NOME DELA ERA SARITA.

SARITA ERA UMA GALINHA BRANCA, DE PENAS RELUZENTES, CRISTA VERMELHA BEM PENTEADA E BICO SEMPRE LIMPO. ELA PASSAVA HORAS SE ARRUMANDO, ALISANDO AS PENAS COM O BICO E DESFILANDO PELO TERREIRO COMO SE FOSSE UMA MODELO NA PASSARELA. MAS, APESAR DA BELEZA, SARITA TINHA UM PROBLEMA SÉRIO: NUNCA ESTAVA SATISFEITA COM NADA.

SE A RAÇÃO VINHA COM POUCOS GRÃOS DE MILHO, ERA UM ESCÂNDALO:
– CÓCÓRÓCÓÓÓÓ! ISSO AQUI É COMIDA DE PATO! EU QUERO MILHO AMARELO, DOCE E REDONDINHO!

SE CHOVIA DEMAIS:
– CÓCÓRÓCÓÓÓÓ! MEU PENTEADO VAI DESMANCHAR! CADÊ O MEU GUARDA-CHUVA?!

E QUANDO FAZIA SOL:
– CÓCÓRÓCÓÓÓÓ! ESTOU DERRETENDO! EU SOU UMA DAMA, NÃO POSSO FICAR TOSTANDO AO SOL!

AS OUTRAS GALINHAS ATÉ ACHAVAM GRAÇA NO "SASSARICO" DA SARITA — O MODO ESPALHAFATOSO COMO ELA RECLAMAVA DE TUDO E DE TODOS. MAS O PROBLEMA FICOU MAIS SÉRIO QUANDO ELA COMEÇOU A SE INCOMODAR COM O DONO DO SÍTIO, O SEU JOAQUIM.

SEU JOAQUIM ERA UM SENHOR DE CHAPÉU DE PALHA, CALÇAS DE SUSPENSÓRIO E OLHOS BONDOSOS. ELE CUIDAVA DO SÍTIO COM CARINHO, MAS CLARO, COLHIA OS OVOS QUE AS GALINHAS BOTAVAM PARA VENDER NA CIDADE E GARANTIR O SUSTENTO DE TODOS.

SARITA, PORÉM, COMEÇOU A SE IRRITAR COM ESSA “EXPLORAÇÃO”.

— "ORA ESSA! A GENTE SE MATA DE BOTAR OVOS, E ELE VAI LÁ, PEGA TUDO E NEM UM OBRIGADO. NEM UMA SOBREMESA DIFERENTE ELE TRAZ! CHEGA DISSO!"

E UM DIA, DURANTE UM DE SEUS PASSEIOS COM CRISTA EMPINADA, ELA FEZ UM ANÚNCIO DRAMÁTICO:

— “ATENÇÃO, SENHORAS GALINHAS! A PARTIR DE HOJE, EU, SARITA, NÃO BOTO MAIS NENHUM OVO. ISSO MESMO! GREVE DE OVOS ATÉ QUE ME TRAGAM COMIDA DECENTE E ME TRATEM COM RESPEITO!”

AS GALINHAS SE ENTREOLHARAM. UMAS ACHARAM QUE ERA MALUQUICE, OUTRAS APLAUDIRAM A CORAGEM. MAS NENHUMA TEVE CORAGEM DE IMITÁ-LA. E SARITA, CONVICTA, PAROU MESMO DE BOTAR.

NO COMEÇO, SEU JOAQUIM ACHOU QUE ERA SÓ UMA FASE. MAS OS DIAS PASSARAM E... NADA. NEM UM OVINHO DA SARITA.

ELA COMEÇOU A ANDAR AINDA MAIS VAIDOSA, COMO SE ESTIVESSE NO CONTROLE DA SITUAÇÃO. MAS A VERDADE É QUE, POR DENTRO, SARITA ESTAVA TRISTE PORQUE SARITA NÃO ERA SÓ VAIDADE. POR TRÁS DOS GRITOS E CACAREJOS, HAVIA UM CORAÇÃO ENORME. ELA ESCONDIA DOS OUTROS UM SEGREDO MUITO TRISTE: SEU PAI, O GALO FORTUNATO, HAVIA MORRIDO HÁ POUCAS SEMANAS. ELE ERA SEU GRANDE ORGULHO E INSPIRAÇÃO. TINHA SIDO O LÍDER DO GALINHEIRO POR MUITOS ANOS, JUSTO, FORTE E SEMPRE PREOCUPADO COM O BEM-ESTAR DE TODOS.

E AGORA, SUA MÃE, A GALINHA LURDINHA, ESTAVA MUITO DOENTE. JÁ NÃO CONSEGUIA CISCAR COM AS OUTRAS, FICAVA DEITADA, OFEGANTE, NUM CANTO DO GALINHEIRO, TOSSINDO E SONOLENTA.

SARITA NÃO SUPORTAVA VÊ-LA ASSIM.

— "EU PRECISO FAZER ALGUMA COISA..." — PENSAVA ELA. — "MAS COMO? EU SOU SÓ UMA GALINHA. UMA GALINHA VAIDOSA, É VERDADE, MAS AINDA ASSIM... UMA GALINHA."

FOI ENTÃO QUE TOMOU UMA DECISÃO CORAJOSA. FOI ATÉ O CANTO MAIS ESCONDIDO DO TERREIRO, ONDE MORAVA O RATO BALTAZAR, UM VELHO RATO QUE TRABALHAVA COMO MENSAGEIRO SECRETO NO SÍTIO. ELE CONHECIA TODOS OS CAMINHOS, ATALHOS E SEGREDOS.

SARITA CHEGOU COM JEITINHO:

— “DESCULPE-ME, SR. RATO... EU PRECISO DE AJUDA.”

BALTAZAR, SEMPRE DESCONFIADO, ERGUEU O NARIZ.

— “AJUDA? DA SENHORA QUE VIVE CACAREJANDO QUE A PALHA ESTÁ TORTA?”

— “É... ESSA MESMA. MAS AGORA O ASSUNTO É SÉRIO.”

ELA CONTOU TUDO. SOBRE A DOENÇA DA MÃE, A MORTE DO PAI E O DESEJO DE CONSEGUIR DINHEIRO PARA LEVAR SUA MÃE A UMA CLÍNICA DE TRATAMENTO DE AVES, NA CIDADE.

— “PRECISO TRABALHAR, BALTAZAR. ME ARRANJA UM JEITO DE SAIR DAQUI.”

O RATO COÇOU OS BIGODES, PENSOU E ENTÃO REVELOU UM SEGREDO: HAVIA UM CIRCO ITINERANTE, CHAMADO CIRCO DO PÓ DE PENAS, QUE PASSARIA NA CIDADE VIZINHA. E ESTAVAM PROCURANDO ANIMAIS TALENTOSOS.

— “VOCÊ... É ESPALHAFATOSA O SUFICIENTE PRA SER ESTRELA DE UM ESPETÁCULO,” DISSE O RATO. — “ACHO QUE POSSO TE ARRANJAR UMA AUDIÇÃO.”

NA CALADA DA NOITE, SARITA ESCAPOU DO GALINHEIRO, COM UMA MOCHILINHA IMPROVISADA NAS COSTAS, LEVANDO APENAS UMA FOTO DOS PAIS, ALGUMAS MIGALHAS DE MILHO E UM COLAR DE CONCHINHAS FEITO POR SUA MÃE.

A VIAGEM FOI LONGA. ELA CRUZOU CERCAS, RIOS, PASTOS E FLORESTAS. ESCAPOU DE RAPOSAS, SE ESCONDEU DE CORUJAS, QUASE FOI ATROPELADA POR UM TRATOR E ATÉ DORMIU NUMA TOCA DE TATU.

QUANDO FINALMENTE CHEGOU AO CIRCO, EXAUSTA, SUJA E COM AS PENAS DESALINHADAS, FOI RECEBIDA POR UM PINGUIM ARTISTA CHAMADO SEBASTIÃO, QUE A LEVOU ATÉ O DIRETOR DO CIRCO: O LEÃO ALFREDO, UM LEÃO VELHO E APOSENTADO DOS PICADEIROS AFRICANOS.

— “VOCÊ QUER SER ESTRELA DO MEU ESPETÁCULO?”

— “QUERO.”

— “O QUE VOCÊ SABE FAZER?”

SARITA HESITOU. PENSOU, PENSOU... E ENTÃO COMEÇOU A CACAREJAR. MAS NÃO ERA UM CACAREJO COMUM. ERA UM CANTO DRAMÁTICO, COM GESTOS, VOLTAS, PASSOS DE DANÇA E CARETAS ENGRAÇADAS. NO FIM, DEU UMA PIRUETA NO AR E CAIU COM UMA REVERÊNCIA DIGNA DE UMA RAINHA.

TODOS APLAUDIRAM.

E ASSIM, SARITA VIROU A GALINHA SASSARICANTE, ATRAÇÃO PRINCIPAL DO CIRCO DO PÓ DE PENAS. SEUS SHOWS LOTAVAM TENDAS, CRIANÇAS GARGALHAVAM, ADULTOS FILMAVAM, E O NOME DELA CORRIA DE BOCA EM BOCA: "VOCÊ JÁ VIU O SASSARICO DA SARITA?"

COM O DINHEIRO QUE GANHOU, SARITA CONSEGUIU LEVAR A MÃE PARA A CLÍNICA. LURDINHA FOI TRATADA POR ESPECIALISTAS, GANHOU REMÉDIOS, ALIMENTAÇÃO ESPECIAL E LOGO VOLTOU A CISCAR CONTENTE.

DEPOIS DE MESES LONGE, SARITA RESOLVEU VOLTAR AO SÍTIO. MAS NÃO PARA RETOMAR A VIDA ANTIGA. ELA QUERIA MUDAR AS COISAS. QUERIA FAZER O BEM.

QUANDO CHEGOU, FOI RECEBIDA COM ESPANTO E EUFORIA.

— “SARITA! A FAMOSA GALINHA ARTISTA!”

— “VOCÊ ESTÁ DIFERENTE!”

E ELA ESTAVA MESMO. CONTINUAVA VAIDOSA, MAS AGORA ERA GENEROSA, PACIENTE E CARINHOSA COM TODOS. E O MAIS IMPORTANTE: TINHA APRENDIDO A USAR SUA VOZ NÃO SÓ PARA RECLAMAR, MAS PARA INSPIRAR.

FALOU COM SEU JOAQUIM E PROPÔS UM ACORDO: PARTE DOS OVOS PODERIA SER TROCADA POR MELHORIAS PARA AS GALINHAS — MAIS ESPAÇO, COMIDA VARIADA, ATENDIMENTO VETERINÁRIO E ATÉ UM ESPAÇO DE RECREAÇÃO COM MÚSICA E JOGOS.

SEU JOAQUIM, SURPRESO E TOCADO PELA INICIATIVA, ACEITOU.

E ASSIM, O RECANTO DO SOL VIROU UM MODELO DE SÍTIO. AS GALINHAS ERAM FELIZES, BEM CUIDADAS E SARITA, AGORA PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO DAS GALINHAS UNIDAS, ERA RESPEITADA POR TODAS.

DE VEZ EM QUANDO, ELA AINDA FAZIA SEUS SASSARICOS. MAS AGORA, ERAM APRESENTAÇÕES PROGRAMADAS, COM MÚSICA, DANÇA E MUITO HUMOR.

E QUANDO ALGUÉM SE QUEIXAVA DEMAIS, ELA DIZIA SORRINDO:

— “RECLAMAR É FÁCIL. DIFÍCIL É FAZER A DIFERENÇA. AGORA, VAMOS SACUDIR ESSAS PENAS!”

E LÁ IA ELA, RODOPIANDO NO TERREIRO, AO SOM DE UM CACAREJO RITMADO QUE ENCANTAVA A TODOS:

— CÓCÓRÓCÓÓÓ... SASSSSARICO NO AR!

DEPOIS DO RETORNO DE SARITA O SÍTIO RECANTO DO SOL NUNCA ESTEVE TÃO ANIMADO. AS GALINHAS AGORA TINHAM SOMBRA PARA DESCANSAR, BRINQUEDOS PARA SE DIVERTIR, GRÃOS VARIADOS E ATÉ UMA PEQUENA BIBLIOTECA FEITA DE CAIXAS DE PAPELÃO, COM LIVROS SOBRE AVES FAMOSAS, CONTOS DE GALINHEIROS DISTANTES E ATÉ RECEITAS DE BOLO DE MILHO.

E NO CENTRO DE TUDO ISSO ESTAVA ELA: SARITA.

MAS, COMO TODO MUNDO APRENDE UM DIA, LIDERAR É MUITO DIFERENTE DE ENCANTAR.

SARITA COMEÇOU A NOTAR QUE ALGUMAS GALINHAS ESTAVAM... DESCONFIADAS.

— “ELA É FAMOSA, TUDO BEM. MAS SERÁ QUE ENTENDE MESMO DA VIDA DURA AQUI NO TERREIRO?” — COCHICHAVAM.

— “ELA VOOU ALTO, MAS AGORA QUER MANDAR EM TUDO?” — DIZIAM OUTRAS.

SARITA OUVIA OS MURMÚRIOS E, EMBORA TENTASSE MANTER O SORRISO, SEU CORAÇÃO SE APERTAVA. ELA SE PERGUNTAVA:

— “SERÁ QUE DEIXEI A VAIDADE SUBIR DE NOVO PARA MINHA CABEÇA?”

FOI ENTÃO QUE, NUMA MANHÃ DE NEBLINA ESPESSA, UM PROBLEMA REAL SURGIU.

AS GALINHAS COMEÇARAM A NOTAR: OS OVOS ESTAVAM SUMINDO.

NÃO ERA O SEU JOAQUIM. ELE AVISAVA QUANDO RECOLHIA. MAS ALGUNS OVOS DESAPARECIAM DURANTE A NOITE, SEM DEIXAR RASTROS. PIOR: UMA DAS GALINHAS MAIS VELHAS, A DONA CÂNDIDA, FOI ENCONTRADA TODA ASSUSTADA, COM PENAS NO CHÃO E OLHOS ARREGALADOS.

— “FOI UM BICHO! UM BICHO MUITO GRANDE!” — GRITAVA ELA, TRÊMULA.

AS GALINHAS ENTRARAM EM PÂNICO. SARITA TENTOU ACALMAR:

— “VAMOS COM CALMA! VOU INVESTIGAR ISSO PESSOALMENTE.”

E MONTOU UM GRUPO DE PATRULHA NOTURNA COM ALGUMAS GALINHAS CORAJOSAS E... O RATO BALTAZAR, CLARO.

NAQUELA NOITE, SARITA FICOU ACORDADA. ESCONDEU-SE PERTO DO GALINHEIRO, CAMUFLADA COM FOLHAS E UM GALHO NA CABEÇA.

POR VOLTA DA MEIA-NOITE, ALGO SE MEXEU NO ESCURO.

UM VULTO GRANDE, PELUDO, COM OLHOS BRILHANTES.

— “É A RAPOSA!” — COCHICHOU BALTAZAR.

MAS QUANDO FORAM CORRER ATRÁS, O BICHO ESCAPOU. DEIXOU APENAS UM FIO DE LÃ PRESO NA CERCA.

BALTAZAR PEGOU O FIO, CHEIROU E DISSE:

— “ISSO NÃO É RAPOSA... É ALGUÉM MUITO MAIS ESPERTO. E MUITO MAIS PERIGOSO.”

 

APÓS INVESTIGAR POR DIAS, DESCOBRIRAM A VERDADE: QUEM ESTAVA ROUBANDO OS OVOS ERA GASTÃO, UM GAMBÁ QUE VIVIA NO BOSQUE AO LADO. ELE HAVIA MONTADO UM CARRINHO E UM SISTEMA DE CORDAS PARA SURRUPIAR OS OVOS SEM SER VISTO.

SARITA FICOU FURIOSA. MARCHOU ATÉ O BOSQUE COM SUA PATRULHA E ENCONTROU GASTÃO DORMINDO COM UM CACHECOL FEITO DE PENAS E UMA BARRIGA ESTUFADA.

— “GAMBÁ GASTÃO!” — GRITOU ELA COM UM CACAREJO PODEROSO. — “EXPLIQUE-SE!”

O GAMBÁ ACORDOU ASSUSTADO, TROPEÇOU NOS PRÓPRIOS PÉS E CAIU EM CIMA DE UMA PANELA.

— “EU SÓ QUERIA ALIMENTO! NÃO TENHO FAMÍLIA, NINGUÉM ME DÁ NADA!”

SARITA HESITOU.

POR UM INSTANTE, PENSOU EM MANDÁ-LO PARA O OUTRO LADO DO BOSQUE. MAS ENTÃO, LEMBROU-SE DO QUE TINHA VIVIDO — DA DOR DA PERDA, DA FOME, DO MEDO.

— “EU ENTENDO. MAS ISSO NÃO JUSTIFICA ROUBAR. NÓS PODÍAMOS TE AJUDAR, SABIA?”

GASTÃO COMEÇOU A CHORAR. E, PARA SURPRESA GERAL, SARITA O CONVIDOU A VIVER NO SÍTIO, COM UMA CONDIÇÃO: TRABALHAR HONESTAMENTE, AJUDANDO NA SEGURANÇA E NA COMPOSTAGEM DO JARDIM.

AS GALINHAS RECLAMARAM NO INÍCIO.

— “UM GAMBÁ? ENTRE NÓS? VAI FEDER TUDO!”

MAS SARITA FOI FIRME:

— “O QUE FEDE MESMO É O PRECONCEITO. TODOS MERECEM UMA SEGUNDA CHANCE.”

E, COM O TEMPO, GASTÃO SE MOSTROU UM ALIADO VALIOSO, FIEL E ATÉ BEM CHEIROSO COM AJUDA DE LAVANDA E SABÃO DE CINZA.

MESES SE PASSARAM E O RECANTO DO SOL VIVIA UMA FASE TRANQUILA. MAS ENTÃO, UM DIA, O CÉU ESCURECEU COMO NUNCA. UMA TEMPESTADE SE APROXIMAVA.

SEU JOAQUIM CORREU PARA PROTEGER OS ANIMAIS, MAS OS VENTOS FICARAM FORTES DEMAIS. ÁRVORES TOMBARAM, O GALINHEIRO BALANÇAVA, E O BARRACÃO ONDE ESTAVAM OS PINTINHOS MAIS NOVOS COMEÇOU A ALAGAR.

— “SARITA! OS PINTINHOS ESTÃO PRESOS LÁ!” — GRITAVA UMA GALINHA.

SEM HESITAR, SARITA CORREU PARA O BARRACÃO. CHUVA NOS OLHOS, VENTO NAS PENAS, BARRO NOS PÉS.

ARROMBOU A PORTINHOLA COM UM CHUTE (BEM DRAMÁTICO), AGARROU OS PINTINHOS E, UM A UM, COLOCOU-OS DENTRO DE UMA SACOLA SECA QUE TRAZIA NAS COSTAS.

LUTOU CONTRA O VENTO, CAIU, LEVANTOU, ESCORREGOU, E POR FIM, CONSEGUIU SALVAR TODOS.

QUANDO O SOL REAPARECEU, AS GALINHAS ESTAVAM EM SILÊNCIO. OLHAVAM PARA ELA COM RESPEITO VERDADEIRO — NÃO POR CAUSA DO BRILHO, MAS POR SUA CORAGEM.

DEPOIS DA TEMPESTADE, O SÍTIO PRECISOU SE RECONSTRUIR. E SARITA LIDEROU TUDO COM HUMILDADE. CRIOU O CONSELHO DAS PENAS UNIDAS, ONDE TODAS AS GALINHAS TINHAM VOZ. IMPLANTOU TURNOS DE CUIDADO COM OS FILHOTES, GRUPOS DE ESTUDOS E ATÉ UM FESTIVAL DE ARTE COM COCORICÓS MUSICAIS.

MAS NUNCA ESQUECEU DE SUA ESSÊNCIA.

TODO SÁBADO À TARDE, DEPOIS DO BANHO DE AREIA E DA REFEIÇÃO DE MILHO COM ERVAS, SARITA COLOCAVA SEU COLAR DE CONCHINHAS E SUBIA NUM TOCO DE ÁRVORE.

E ALI, FAZIA SEU SASSARICO MAIS FAMOSO: UMA MISTURA DE DANÇA, RISOS, CONSELHOS E POESIA.

E, NO FIM, SEMPRE DIZIA COM UM BRILHO NO OLHAR:

— “CADA PENA NOSSA CARREGA UMA HISTÓRIA. E SE A GENTE VOAR JUNTAS, NENHUMA TEMPESTADE NOS DERRUBA.”

AS GALINHAS BATIAM AS ASAS EM APLAUSO.

E O CÉU DO RECANTO DO SOL SE ENCHIA DE ESPERANÇA.