DESDE QUE SE ENTENDIA POR GENTE, MARINA CARREGAVA A ALEGRIA NO BOLSO. ERA UMA MENINA DE DOZE ANOS COM OLHOS CURIOSOS E CABELOS CACHEADOS QUE DANÇAVAM COM O VENTO. ACORDAVA ANTES DO DESPERTADOR SÓ PARA VER O NASCER DO SOL PELA JANELA DO QUARTO, E SEU CADERNO DE ANOTAÇÕES ERA RECHEADO DE PENSAMENTOS COLORIDOS, LISTAS DE DESEJOS E BILHETES PARA O FUTURO. VIVIA NUMA CIDADE PEQUENA, ONDE TODO MUNDO SE CONHECIA PELO NOME E AS BICICLETAS ERAM O MEIO DE TRANSPORTE PREFERIDO.

NUM DESSES DIAS COMUNS DE PRIMAVERA, MARINA SAIU DE CASA COM SUA MOCHILA AZUL-CLARA E O CORAÇÃO SALTITANTE. ERA A SEMANA DO FESTIVAL DA ALEGRIA NA ESCOLA, E ELA ERA A RESPONSÁVEL POR ORGANIZAR A APRESENTAÇÃO FINAL: UM TEATRO SOBRE SENTIMENTOS. MARINA QUERIA ALGO ESPECIAL, ALGO QUE FIZESSE AS PESSOAS RIREM E CHORAREM, TUDO AO MESMO TEMPO.

ENQUANTO PEDALAVA, ALGO NO AR PARECIA DIFERENTE. UM PERFUME DOCE, COMO BAUNILHA MISTURADA COM FLOR DE LARANJEIRA, FLUTUAVA PELA RUA. ELA OLHOU PARA OS LADOS, MAS NÃO VIU NINGUÉM. FOI QUANDO UMA PENA COR-DE-ROSA CAIU DO CÉU BEM NA SUA FRENTE. FREOU A BICICLETA COM CUIDADO E A PEGOU. ERA MACIA E BRILHANTE, COMO SE TIVESSE SIDO FEITA DE RAIO DE SOL.

NO INSTANTE EM QUE TOCOU A PENA, UM ESTALO SUAVE ECOOU AO SEU REDOR. E ENTÃO, ELE APARECEU: UM MENINO COM ASAS TRANSPARENTES, PEQUENAS COMO AS DE UM VAGA-LUME, E UM ARCO MINÚSCULO NAS MÃOS. USAVA UMA ROUPA QUE PARECIA FEITA DE NUVEM E RELVA, E TINHA UM SORRISINHO DE QUEM SABE DE TUDO.

— OLÁ, MARINA. SOU CUPIDO.

ELA PISCOU. DUAS VEZES.

— VOCÊ É REAL? — PERGUNTOU, SEM SABER SE RIA OU CORRIA.

— MAIS REAL DO QUE QUALQUER SENTIMENTO QUE VOCÊ JÁ TEVE. VIM PORQUE VOCÊ PRECISA DE MIM.

— PRECISO? MAS EU NEM ESTOU APAIXONADA!

CUPIDO RIU, UM SOM QUE PARECIA SINOS DE VENTO.

— AMOR NÃO É SÓ POR PESSOAS. ÀS VEZES, A GENTE PRECISA SE APAIXONAR POR UMA IDEIA, UM MOMENTO, UM SONHO. E VOCÊ TEM UM SONHO PARA ESTE FESTIVAL, NÃO TEM?

MARINA ASSENTIU DEVAGAR.

— QUERO CRIAR UMA APRESENTAÇÃO QUE TOQUE O CORAÇÃO DAS PESSOAS. MAS ÀS VEZES ACHO QUE NÃO SOU CAPAZ.

CUPIDO FLUTUOU ATÉ ELA E TOCOU LEVEMENTE SUA TESTA COM O ARCO.

— EU VOU TE AJUDAR. MAS VOCÊ PRECISA ESCUTAR SEU PRÓPRIO CORAÇÃO. É LÁ QUE MORA A ALEGRIA VERDADEIRA.

NOS DIAS SEGUINTES, COISAS ESTRANHAS E MARAVILHOSAS ACONTECERAM. MARINA ESCREVIA UMA CENA, E AS PALAVRAS PARECIAM SAIR DANÇANDO DO LÁPIS. QUANDO ENSAIAVA COM SEUS COLEGAS, TODO MUNDO SE ENVOLVIA DE UM JEITO NOVO, COMO SE ALGO INVISÍVEL UNISSE O GRUPO. O CENÁRIO, FEITO DE PAPELÃO E TINTA GUACHE, PARECIA UMA FLORESTA ENCANTADA.

MAS FOI NA VÉSPERA DO FESTIVAL QUE TUDO DESANDOU. UMA DAS ATRIZES, CLARA, FICOU DOENTE. O CENÁRIO RASGOU COM O VENTO FORTE DA TARDE. E MARINA, CANSADA E FRUSTRADA, SENTOU-SE NO PALCO VAZIO E CHOROU.

— CUPIDO? VOCÊ AINDA ESTÁ AÍ? — MURMUROU.

UMA BRISA SUAVE PASSOU, E ELE APARECEU, COM O MESMO SORRISO DOCE.

— ESTÁ TUDO DANDO ERRADO. ACHO QUE A ALEGRIA ME DEIXOU.

CUPIDO SE SENTOU AO LADO DELA.

— A ALEGRIA NÃO É SÓ RISOS E ACERTOS, MARINA. ÀS VEZES, ELA SE ESCONDE NAS LÁGRIMAS E NOS RECOMEÇOS. TUDO ISSO QUE VOCÊ SENTE AGORA VAI FAZER PARTE DA APRESENTAÇÃO. VOCÊ TEM CORAGEM DE CONTINUAR?

ELA RESPIROU FUNDO, ENXUGOU OS OLHOS E SE SE LEVANTOU.

— TENHO. PORQUE AGORA SEI QUE ALEGRIA É SER VERDADEIRA.

NO DIA SEGUINTE, A ESCOLA SE ENCHEU DE FAMÍLIAS, CRIANÇAS E PROFESSORES. O SALÃO ESTAVA DECORADO COM FITAS COLORIDAS E FLORES DE PAPEL. MARINA USOU UM VESTIDO AMARELO E UM COLAR FEITO DE MIÇANGAS POR SUA AVÓ. QUANDO AS CORTINAS SE ABRIRAM, TUDO GANHOU VIDA.

O TEATRO MOSTRAVA A JORNADA DE UMA MENINA QUE PROCURAVA A ALEGRIA EM COISAS GRANDES, COMO CASTELOS E FOGOS DE ARTIFÍCIO, MAS SÓ A ENCONTRAVA NAS PEQUENAS COISAS: UMA AMIZADE SINCERA, UM PERDÃO INESPERADO, UMA FLOR QUE BROTA SOZINHA. O PÚBLICO RIA E SE EMOCIONAVA, E NO FINAL, QUANDO MARINA ENTROU EM CENA PARA O ÚLTIMO MONÓLOGO, HAVIA UM SILÊNCIO TÃO DENSO QUE PARECIA QUE O MUNDO TINHA PARADO.

— A ALEGRIA NÃO É UM LUGAR, NEM UM OBJETO. É ALGO QUE A GENTE CARREGA DENTRO, MESMO QUANDO TUDO PARECE ESCURO. EU ENCONTREI A MINHA, E ELA ESTAVA NO SORRISO DA MINHA MÃE, NA AJUDA DOS MEUS AMIGOS, E ATÉ NAS MINHAS DÚVIDAS. E VOCÊ? ONDE ESTÁ A SUA ALEGRIA?

AS PALMAS VIERAM COMO UM TROVÃO SUAVE, ACOMPANHADAS DE OLHOS MAREJADOS. MARINA OLHOU PARA O ALTO E VIU UMA PENA COR-DE-ROSA CAIR NOVAMENTE. SORRIU.

DEPOIS DO FESTIVAL, ALGO MUDOU NA CIDADE. AS PESSOAS SORRIAM MAIS. CRIANÇAS BRINCAVAM NA PRACINHA COM MAIS LEVEZA. MARINA CONTINUAVA COM SUA BICICLETA E SEU CADERNO, AGORA CHEIO DE NOVAS HISTÓRIAS. E DE VEZ EM QUANDO, ELA SENTIA UM PERFUME DE BAUNILHA COM FLOR DE LARANJEIRA, E SABIA QUE CUPIDO ESTAVA POR PERTO.

ELA NUNCA MAIS O VIU, MAS SEMPRE QUE PRECISAVA, SENTIA AQUELE ESTALO SUAVE NO CORAÇÃO. PORQUE ALEGRIA, ELA APRENDERA, É COMO UM CUPIDO SILENCIOSO: APARECE QUANDO A GENTE SE PERMITE SENTIR, MESMO QUANDO O MUNDO PARECE DESABAR.

E ASSIM, MARINA CRESCEU LEVANDO A ALEGRIA NO BOLSO, COMO SEMPRE. MAS AGORA, ELA SABIA QUE ESSA ALEGRIA VINHA COM ASAS. E QUE O AMOR, DE TODAS AS FORMAS, ERA O FIO INVISÍVEL QUE COSTURAVA A VIDA COM SENTIDO.